Lembrança de Homens que Não Existiam traz um diálogo em que o conflito entre a imagem e a palavra desfigura a realidade construída para revelar o Vazio, o Nada, de onde surge o ponto de partida para as buscas íntimas do ser humano. É dentro de um ambiente de indagações e descobertas que os amantes se encontram e se despedem num ir e vir constante que se modifica conforme as indomáveis inquietações do Homem. As metáforas abundantes e singulares servem para indicar os elementos de inversão, anulação, reduplicação e deslocamento do eu e da realidade. Como em Lacan, em que “a formação do [eu] é simbolizada oniricamente por um campo fortificado, ou mesmo um estádio, que se estende da arena interna até sua muralha, até seu cinturão de escombros e pântanos, dois campos de luta opostos em que o sujeito se enrosca na busca do altivo e longínquo castelo interior”. Em Lembrança de Homens que não existiam o “castelo interior” é o desejo intrínseco de se encontrar no outro, isto é, na outra metade de si mesmo, de se desfazer e refazer no outro para, desta forma, completar-se e estabelecer uma relação entre o mundo interior e o exterior. Além da linguagem rica em antítese, oximoro e paradoxo, repleta de associações que quebram o aspecto lógico, entre as características de Floriano Martins encontra-se a temática do abismo, da vertigem, do nome, da casa, da metapoesia, do espelho. O espelho onde o Homem é confrontado consigo mesmo, onde ele se reconhece e se multiplica. Floriano Martins arruína a perspectiva, desestruturando-a, projetando o sentido das palavras para fora de si, deslocando-as para restabelecer uma nova imagem, vista de uma dimensão ambígua e de um ponto alucinatório. E, por fim, as linhas expressivas das fisionomias desenhadas por Valdir Rocha reforçam o trajeto inquisitivo dos poemas, adicionando à interpretação mais uma extensão imagética.
Viviane de Santana Paulo | Berlim, 02/8/2013
Floriano Martins (Fortaleza, 1957). Poeta, ensaísta, tradutor e editor. Diretor da Agulha Revista de Cultura [www.revista.agulha.nom.br] e da ARC Edições. Estudioso do Surrealismo e de poesia de língua espanhola. Tradutor de Federico García Lorca, Guillermo Cabrera Infante, Pablo Antonio Cuadra e Aldo Pellegrini. Alguns de seus livros de poemas: Cenizas del sol [edição trilíngue, com o escultor Edgar Zúñiga] (Costa Rica, 2001), Tres estudios para un amor loco [tradução de Marta Spagnuolo] (México, 2006), Duas mentiras (Brasil, 2008), Teatro imposible [tradução de Marta Spagnuolo] (Caracas, 2008), A alma desfeita em corpo (Portugal, 2009), Fuego en las cartas (edição bilíngue, tradução de Blanca Luz Pulido] (Espanha, 2009), Autobiografia de um truque (Brasil, 2010), Delante del fuego [traducción de Benjamín Valdivia] (México, 2010), Abismanto [com Viviane de Santana Paulo] (Brasil, 2012). arcflorianomartins@gmail.com.
Valdir Rocha (São Paulo, 1951) é pintor, desenhista, escultor e gravador, com dedicação às artes plásticas desde 1967. Parte expressiva de suas obras está reproduzida nos seguintes livros: Mentiras, Verdades-meias e Casos Veros (desenhos, pinturas, esculturas e textos diversos), São Paulo, 1994; Xilogravuras, São Paulo, 2001; Cabeças. São Paulo, 2002; Gravuras em Metal, São Paulo, 2002; Títeres de Ninguém, Florianópolis, 2005; SÓS (desenhos e pinturas sobre papel impresso), São Paulo, 2010; e Confidências (desenhos e pinturas sobre papel impresso), São Paulo, 2013. A obra de Valdir Rocha é objeto de diversas monografias, como as seguintes: A Escultura de Valdir Rocha, de Mirian de Carvalho, São Paulo, 2004, e O Desenho de Valdir Rocha, de Péricles Prade, São Paulo, 2010. Em 2012, foi publicado o livro Só sobre SÓS, de Valdir Rocha, coordenado por Péricles Prade, Florianópolis, com textos de 17 autores. Realizou exposições individuais e participou de algumas coletivas. vr@valdirrocha.art.br.
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